COLOCAR ALGUMAS PEÇAS SOBRE A QUESTÃO PALESTINIANA

Gisandra Oliveira

Porto, 2015

Uma inteligência partilhada da situação não pode nascer de um texto só, mas de um debate internacional. E para que o debate aconteça é preciso colocar algumas peças. (Aos nossos amigos, 2015,14)

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Procurar estabelecer laços no panorama actual

Com alguma apreensão, mas sem emitirmos pios mobilizadores de uma legítima preocupação, nem estilhaços de acções directas, vemos a Europa consolidar, com algum secretismo (expondo agora de forma evidente os seus procedimentos anti-democráticos), o TTIP (Transatlantic Trade and Investment Partnership) ou a PTCI (Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento). Trata-se de um acordo comercial entre a União Europeia e os Estados Unidos da América que está a ser arquitectado, desde Julho 2013, entre a Comissão Europeia e o Governo norte-americano com a participação de corporações multinacionais. Esta parceria entre a União Europeia e os EUA, além de favorecer o poder dos interesses corporativistas; ameaçar os direitos das trabalhadoras e o direito ambiental; também ameaça invalidar as recentes medidas tomadas na UE1; e limitar, impedir e até criminalizar qualquer expressão política e mobilização solidária na luta pela liberdade dos povos. Entre estas, as possíveis acções da sociedade civil de se poderem exprimir através do Boicote, Desinvestimento e Sanções2 em solidariedade com o povo palestiniano.

Apesar das políticas europeias reforçarem o policiamento e a criação de dispositivos de protecção nas fronteiras3, numa lógica em que a condição de refugiado perdeu definitivamente o seu rosto humano, sabemos que a nossa pertença ao mundo não acaba numa linha imaginária às portas do Mediterrâneo, desde o mar do Norte, passando pelo Golfo de Biscaia, pelas Colunas de Hércules e as Ilhas Gregas. Não podemos esquecer que as políticas securitárias decididas pela União Europeia revestem várias formas e manifestam-se de várias maneiras, contudo todas elas procuram propagar a ideia de uma “ameaça comum”, validando as próximas “manobras” da NATO. Esta “operação musculada” chama-se “Trident Juncture 2015”4. As três pontas deste “tridente”querem reforçar o estado de excepção paulatina e ardilosamente implementado nos Estados Europeus. Uma das propostas, que vai decorrer em Lisboa no fórum industrial (19 e 20 de Outubro 2015)5, propõe o aumento do orçamento e dos investimentos militares alegando a necessidade da “defesa” através de operações com “efeitos dissuasores”, que verá, a 5 de Novembro de 2015, a realização de um “evento marítimo pesado”6. Espanha, Itália e Portugal constituem o “tridente” que promove a ficção da “ameaça comum” a que a NATO chama “potenciais inimigos”.

Mesmo se as lutas que nos são mais próximas levam-nos a uma postura de territorialização e priorização das urgências, deixando-nos contaminar natural e necessariamente pelas agendas partidárias, pelo ritmo político institucional ou pelo que os media trazem à custa do voyeurismo social, não nos podemos pensar em termos anarquistas7 separadas das grandes movimentações políticas europeias, mas também não nos podemos alhear das lutas mundiais como o movimento Zapatista, ou as lutas de Kobane/Rojava e muito menos da questão Palestina/Israel8 por vários motivos. Sobre esta última, podemos de imediato destacar três razões. Primeiro, porque forçámos a entrada das suas Histórias nos anais da história do Ocidente e do Mundo. Segundo, porque a nossa humanidade enforma os laços solidários diante da opressão, repressão, segregação e destruição actuais como passadas. E finalmente, porque tudo contra o que lutamos no geral- uma ordem social encostada a um sistema de dispositivos9 manobrados e regidos pelo capitalismo e o Estado – encontra-se em jogo quotidianamente na Palestina/Israel. Mesmo na distância geográfica que nos separa do Médio Oriente, podemos encontrar múltiplas razões para uma actuação mais regular e sistemática contra a máquina capitalista, os instrumentos dos Estados e as engrenagens securitárias.

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Quando as palavras estão contaminadas

Trazer a questão Palestiniana para a cena anarquista no Ocidente revela certas reticências e apresenta algumas dificuldades. As reticências formulam-se principalmente em torno da linguagem, enquanto as dificuldades envolvem percepções políticas e noções ideológicas. Em torno da linguagem, a questão Palestiniana está contaminada por dispositivos regidos pelo paradigma ocidental que insistem em querer tratar do assunto. É uma máquina oleada pelo direito internacional, envolvendo a Convenção de Genebra, o Tribunal Penal Internacional e a ONU, que só funciona e se aplica no quadro da noção de Estado. Uma máquina composta por Estados que votam e vetam alegremente num tabuleiro geopolítico em que só há lugar para os interesses de alguns. Uma engrenagem selectiva que legitimou o seu direito universal à ingerência internacional através de recortes fronteiriços, pressões e sanções económicas e de intervenções militares.

De um modo geral, uma das dificuldades do anarquismo, sobre a questão palestiniana, prende-se com o sistema implementado pelas democracias liberais, tal como a representatividade. Nesta perspectiva, a causa palestiniana tem vindo a ser terreno eleito, embora naturalmente pouco gratificante, das agendas políticas partidárias das esquerdas europeias, através de grupos ou associações com um pé nos parlamentos e outro nos dispositivos humanitários institucionais ou não. No contexto português, curiosamente, o grupo parlamentar de amizade Portugal – Palestina é o único grupo que tem no seu seio membros de todas as cores políticas presentes no Parlamento10. Não sendo um terreno para ganhos eleitorais concretos é relativamente fácil manter laços para divulgação, informação e até para realizar acções conjuntas com estes grupos. Como é de esperar, cada grupo partidário tem tendência para veicular as ideias dos seus homólogos palestinianos. Assim, a grande diferença ideológica reside essencialmente, do ponto de vista anarquista, em trabalhar com as decisões da sociedade civil palestiniana e dos comités de resistência popular, contra a opressão e a ocupação. Contudo, em traços gerais, tudo gira em torno de uma palavra: auto-determinação.

Se num dicionário a palavra auto-determinação, aplicada ao campo político, significa a livre escolha de um estatuto político e de um desenvolvimento social, económico e cultural, nesta máquina neoliberal, a auto-determinação concebe-se dentro da noção de Estado, portanto enquanto auto-determinação nacional, envolvendo um povo e um território. Todos os processos de auto-determinação vão ao encontro de noções fixadas por entidades e organismos que apenas concebem os direitos das pessoas dentro dos limites constrangedores e limitadores dessas noções. Assim, não existem mecanismos que contemplem as legítimas reivindicações de uma população a, simplesmente, viver a sua vida nas suas terras, sem se submeterem a uma forma de organização política de acordo com o que essas mesmas entidades reconhecem como adequada.

Mas, para que haja auto-determinação dos povos, terá de haver “povo”, algo que ligue as pessoas entre si, as pessoas que constituem esse grupo, essa comunidade, esse povo. Muito sucintamente, no caso europeu, os povos agruparam-se dentro de limites territoriais que mais tarde se definiram como Estados. No caso de Israel, o ser judeu é algo que, ao nomear-se como tal, definiu-se na opressão e subverteu os princípios falseados do racismo e, em particular, do anti-semitismo, contudo é importante realçar que o ser judeu transcende o judaísmo enquanto religião. Enquanto o ser palestino é definido em relação à realização do ser judeu na Palestina, portanto inseriu-se também na categoria de povo oprimido. Por um lado, a comunidade judaica, através do movimento sionista11 e as suas ramificações, acabou por estabelecer o seu território na Palestina, com base num colonialismo moderno, na ocupação e, continua as suas práticas expansionistas. No caso palestiniano, o povo formulou-se como um todo no quadro de resistências à contínua opressão e repressão exercida pela soberania israelita sobre um território que habitavam e habitam.

O dispositivo12 imperialista, implantado no Médio Oriente e em particular na Palestina/Israel, tem vindo a ser reformulado pela ideologia política sionista13. Esta ideologia praticada pelos sucessivos governos de Israel tem características nacionalistas e proteccionistas muito vincadas. Se por um lado, as esquerdas viram a criação de Israel como a possível concretização de um grande projecto revolucionário, algo com cariz quase utópico, mas também algo que pudesse envolver a noção de refugiado14, como uma condição inovadora questionando a noção de estado-nação, a partir dos anos 80, este sonho foi perdendo consistência com as evidências da violência das práticas dos governos sionistas. Ainda assim, uma estranha mistura de esperança, entre realismo e ilusão, apesar de enquadrada no sistema definido pelas democracias ocidentais, permanece, como quando Alain Badiou escreve em 2006 que a fundação de Israel «foi um contra-acontecimento, parte de um contra-acontecimento maior: o colonialismo, a conquista brutal por parte de gente vinda da Europa de uma nova terra onde vivia já outro povo. Israel é uma mistura extraordinária de revolução e reacção, de emancipação e de opressão. O estado sionista tem de se tornar o que continha em si de justo e de novo. Tem de se tornar o menos racial, o menos religioso e o menos nacionalista dos Estados. O mais universal de todos eles.»15. Por outro lado, verificamos que as circunstâncias históricas da criação do Estado de Israel formularam-se com base no estado de excepção16 que persiste até hoje. Ao formular um estado de ameaça contínua, que necessita de um exército permanente ao serviço da defesa, que funciona num vazio legal, legitimando acções ilegais, validando a impunidade mundial e alimentando o capitalismo e o mercantilismo17, o Estado de Israel exerce a sua soberania18 – com variantes legais de acordo com o estatuto atribuído às origens de cada indivíduo– sobre toda a população na região. Embora a prática de um colonialismo tardio, que se revela como a forma mais elaborada do necropoder19, tenha consequências sociais desastrosas, também abre uma possibilidade inesperada em termos anarquistas nos Territórios Ocupados20 como podemos verificar com o trabalho desenvolvido pelos comités de resistência popular em conjunto com outros grupos e colectivos como os Anarquistas contra o Muro (AAtW)21.

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Colocar mais umas peças

Temos frequentemente uma percepção ideológica preconcebida, ou generalizada de três assuntos prementes para o pensar anarquista relativamente à Palestina: o uso da bandeira; a questão do nacionalismo; a questão da criação de um estado Palestiniano. São três assuntos que resistem ao pensamento anarquista por serem incompatíveis, contudo, num contexto de opressão contínua merecem alguma atenção.

Ainda que múltiplas insurreições, ou uma revolução social, sejam o ideal para derrubar o sistema que nos oprime, não podemos esquecer a realidade social e política que nos rodeia. Quer na revolução, quer na construção colectiva, o anarquismo surge como um meio, não um fim. Fornece-nos instrumentos e ferramentas para construir colectivamente formas de organização social em que o ser humano ocupa o espaço todo com a liberdade individual e colectiva, com a solidariedade baseada no princípio de apoio-múto e com princípios decisórios horizontais para todos os aspectos das nossas vidas. Se neste momento precisamos de anarquistas para todas as insurreições, para as revoluções ainda por vir, simultaneamente, também precisamos dessa construção colectiva.

Enquanto as vozes populares dos povos submetidos aos Estados gritam por uma “democracia real”, as vozes palestinianas gritam pela água, gritam pelas suas casas e terras. Gritam contra a ocupação, contra o Apartheid, contra o muro, contra as detenções administrativas. Enquanto milhares de pessoas invadem as praças dos seus países, a fragmentação territorial e as barreiras que impedem a movimentação de pessoas e bens na Cisjordânia, levam a uma extrema organização e coordenação de cada comité de resistência popular em cada aldeia, campo de refugiado, vila ou cidade na luta por coisas muito simples e básicas, como o direito a viver.

É importante esclarecer que o uso da bandeira palestiniana durante as manifestações é muito mais um acto de resistência e irreverência, obviamente reprimido, do que a expressão de um nacionalismo visto e concebido segundo o nosso ser “ocidental”. Quanto à questão do nacionalismo palestiniano, resume-se muito mais a uma identidade camponesa desapossada que, além de nunca ter tido a oportunidade de se pronunciar sobre o seu próprio destino, separou-se rapidamente da pura retórica nacionalista árabe e das elites locais para formar a sua identidade palestiniana na luta contra o sionismo22.

Sem aprofundar as distinções teóricas elaboradas pelo anarquismo sobre as noções de estado-nação-pátria. Podemos ver duas grandes tendências anarquistas na abordagem ao nacionalismo. Para Proudhon e Bakunine, há que negar qualquer pertença nacional, como algo que aliena e manipula, e procurar uma pertença universal sem fronteiras. Para Kropotkine, o nacionalismo faz parte de um processo histórico para alcançar uma organização social ideal. Portanto, neste sentido, o nacionalismo seria um passo necessário para a auto-determinação e, depois, o internacionalismo. Mas para Kropotkine o processo de auto-determinação nacional não tem necessariamente que se inscrever num território definido e delimitado. Anarquistas como Bernard Lazare e Hillel Solotaroff, partindo do pensamento de Kropotkine, criaram uma ruptura com todos os princípios anarquistas ao introduzir a condição de uma comunidade judia, como um grupo homogéneo nacional pelas circunstâncias históricas comuns, principalmente quando mais tarde apoiaram a necessidade de um território para acolher essa comunidade: a Palestina.

A questão em torno da criação de um estado palestiniano prende-se essencialmente com os discursos e princípios definidos pelas democracias ocidentais. Se inicialmente, houve o desejo das elites árabes, em negociações íntimas com os britânicos, para a criação de um grande estado árabe, a ideia de um território/estado palestiniano formulou-se no seio das manobras da SDN/ONU23, i.e., uma entidade externa que dita as regras internacionais, principalmente com o aquiescer de alguns Estados que assinaram e “aderiram” aos seus princípios, cartas, declarações e que procuram auto-legitimar as suas decisões internacionalmente acrescentando sentido à própria noção de estado-nação e validando a ingerência. Vemos que segundo o sistema actual, a única entidade que garante os direitos colectivos e individuais de um povo vivendo em determinado território é a submissão de uma população ao poder de um Estado. Ainda que o Estado, para ser reconhecido como tal deva apresentar as seguintes características gerais: 1) ter um território; 2) ter uma população permanente nesse território; 3) ter uma forma de organização politica; 4) manter laços diplomáticos com outros países. Curiosamente, estas características nem sempre contemplam os limites do território, nem o número de habitantes ou a deslocação em massa de populações e ainda menos indicam que a organização política terá de se enquadrar no paradigma democrático ocidental.

O que é certo é que outra forma de organização social é possível, basta construí-la colectivamente. Contudo, não havendo ainda esta construção e sendo o paradigma ocidental de democracia amplamente implementado, se as aspirações do povo palestiniano estão direccionadas para formarem um Estado, será uma aspiração legítima, dadas as circunstâncias da opressão, ocupação e segregação, mas também as circunstâncias políticas, exactamente como as aspirações do movimento de libertação nacional sionista, ou outros movimentos de libertação, seguiram esse caminho. Na verdade, o movimento sionista tinha todos os instrumentos práticos e teóricos para seguir uma senda totalmente diferente, como a experiência dos kitubtzim deixou entrever. Contudo, não aconteceu, possivelmente por causa de interesses que ultrapassam a nossa compreensão e pelas circunstâncias históricas da 2ª Guerra Mundial. Um profundo nacionalismo de direita e extrema-direita apoderou-se da sociedade israelita e os resultados encontram-se facilmente através da expressão das forças políticas predominantes no governo. Neste contexto, a verdade é que uma aspiração do povo palestiniano por um Estado surge como aquela que vai garantir os direitos do povo palestiniano, mesmo que se submetendo a outro opressor.

Surgem-nos imensas questões para as quais não temos respostas definitivas a longo prazo. Apesar disto tudo parecer incompatível com os princípios anarquistas, os grupos anarquistas em Palestina/Israel continuam a desenvolver um trabalho importantíssimo com os comités populares locais. Assim, na luta contra a opressão, quer seja local, quer na distância, como construir um compromisso refugiado por natureza e ideologia, mas empenhado no trabalho fundamental desenvolvido com as comunidades locais com base na solidariedade?

1Linhas Directrizes, publicadas no Jornal Oficial da UE (2013/C 205/05), relativas à “elegibilidade das entidades israelitas, estabelecidas em territórios ocupados por Israel desde 1967 (…)”. Consultável em linha:

http://www.eeas.europa.eu/delegations/israel/documents/related-links/20130719_guidelines_on_eligibility_of_israeli_entities_en.pdf

2BDS (Boicote, Desinvestimento, Sanções) é um movimento, iniciado pela sociedade civil palestiniana em 2005, que tem vindo a ser uma fonte de preocupação crescente para o actual governo de Israel e tem levado Israel e os EUA a tomarem as respectivas contra-medidas políticas e legais. O Apelo do movimento BDS encontra-se consultável em linha: http://www.bdsmovement.net/call

3Estes dispositivos constituem barreiras que podemos percepcionar como um prolongamento do muro de separação, cuja construção foi iniciada em 2003 pelo governo de Israel, já que constitui um impedimento ao movimento de pessoas e bens dentro desses limites, mas não entre Israel e o resto do mundo.

4Notícia consultável em linha: http://www.publico.pt/politica/noticia/portugal-acolhe-em-2015-exercicio-da-nato-que-paises-do-leste-reivindicavam-1668596

5Notícia consultável em linha: http://www.act.nato.int/industryforum

6Notícia consultável em linha: http://www.act.nato.int/trident-juncture-15

7Aqui o termo remete para 4 princípios gerais e básicos: autonomia, autogestão, internacionalismo e acção directa.

8O termo Palestina/Israel remete para o território do tempo do mandato britânico (1920-1948), posto que a situação actual se definiu dentro dos limites desse território, cujo futuro político prescindiu da consulta da população sendo atribuído aos Britânicos como uma das esferas de influência na região nos acordos Sykes-Picot em 1916.

9A palavra dispositivo remete para o pensamento de Foucault, retomado por Agamben (2007, 31) como sendo “tudo aquilo que de uma forma ou de outra tem a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, moldar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres vivos”.

10Comunicação de Bruno Dias, Presidente do Grupo Parlamentar de amizade Portugal – Palestina, a 28 de Maio de 2015, na Assembleia da República num encontro com a Delegação do Parlamento Palestino.

11O movimento sionista é composto por várias correntes e apresenta diferentes definições. Por exemplo, para Noam Chomsky, na entrevista intitulada “Israel in global context”, datada de Junho 1997, o “sionismo significava uma oposição a um estado Judeu. O movimento sionista só se revelou oficialmente a favor de um estado Judeu por volta de 1942. (…) Durante muito tempo, o movimento sionista opôs-se à criação de um estado Judeu, porque tal estado seria discriminatório e racista.». Consultável em linha: http://www.chomsky.info/interviews/19970609.htm

12Idem nota 9.

13Tendo em conta que a palavra sionismo envolve várias definições e percepções sensíveis, é preciso especificar que a utilizamos neste texto como a prática de uma ideologia política expansionista e opressora. Não estamos a invalidar uma aspiração histórica, nem o legítimo desejo de segurança que o sionismo representou e representa para um grupo de pessoas de confissão e/ou de cultura judaica, mesmo se esta aspiração e desejo apenas se enquadram na noção que contestamos no geral de estado-nação. O sionismo formulou-se principalmente na Europa Oriental no contexto dos progromes (Rússia 1881-1882), do anti-semitismo, das opressões e repressões. Teve vários teóricos e pensadores como: Léon Pinsker (Rússia, 1821-1891) teórico da soberania nacional judia; Aaron David Gordon (Rússia, 1856-1922), profeta inspirado por um regresso à natureza e ao trabalho agrícola; Theodor Herzl (Austro-Hungria, 1860-1904) fundador do sionismo político; Bernard Lazare (França, 1863-1903) a favor de um sionismo anarquista e internacionalista; Martin Buber (Áustria, 1878-1965) a favor de um estado único, ético e pacífico; Ber Borochov (Rússia, 1881-1917) teórico do sionismo marxista e Yossef Haïm Brenner (Rússia, 1881-1921) por uma identidade judia secular liberta da tutela religiosa.

14Sobre a noção de refugiado, Hannah Arendt e Giorgio Agamben, trouxeram-nos uma pequena luz, em que a condição de refugiado funcionaria como um paradigma de uma nova consciência histórica que envolveria o declínio do estado-nação e potenciaria a formação de uma comunidade política ainda por vir.

15Alain Badiou, “The question of democracy”, Lacanian Ink, nº28, Outono de 2006, p.59.

16Segundo Agamben (2010) o estado de excepção viu os seus mecanismos e dispositivos criados a partir da primeira guerra mundial para servirem como modelo de governo. O estado de excepção constitui um vazio de direito, em que os decretos surgem como força de lei, baseando-se, por exemplo, na ameaça constante e nas respectivas politicas securitárias.

17Retomamos aqui a palavra mercantilismo como sendo “uma determinada organização da produção e dos circuitos comerciais segundo o princípio de que, em primeiro lugar, o Estado deve enriquecer pela acumulação monetária, em segundo, deve reforçar-se pelo aumento da população, em terceiro, deve estar e manter-se num estado de concorrência permanente com as potências estrangeiras.” (Foucault, 2010, 29)

18Aqui a palavra soberania, intimamente ligada à noção de estado-nação (um conceito em que não nos revemos ideologicamente), remete para a definição de Mbembe, partindo de Foucault, i.e., como sendo a expressão do poder e da capacidade de decidir quem pode viver e quem deve morrer. Ver Achille Mbembe, «Nécropolitique”, Raisons politiques, 2006/1, p. 29-60. DOI: 10.3917/rai.021.0029.

19Ver Achille Mbembe (op.cit, p.43).

20Os chamados Territórios Ocupados remetem para a Cisjordânia, dentro do limite da linha verde – ou a fronteira antes da guerra dos seis dia em 1967 – e para a zona dos Golãs território Sírio igualmente ocupado por Israel desde 1967.

21Ler “Israeli anarchism: Statist dilemmas and the dynamics of joint struggle” de Uri Gordon em Dysophia nº3, Junho 2012, pp.30-46, consultável em linha: https://dysophia.files.wordpress.com/2012/05/dysophia3web.pdf

22A palavra sionismo remete aqui para o sionismo político de carácter expansionista (ver nota 13). Ler o artigo de Maciel Santos, “Palestinianos desde quando? Um livro sobre os nacionalismos da Palestina”, Folhas Soltas nº3, Outubro 2013, pp.11-16.

23A Sociedade das Nações/Liga das Nações surgiu depois da 1ª Guerra Mundial (1919) e foi substituída pela ONU – Organização das Nações Unidas – depois da 2ª Guerra Mundial, em 1945.